No outro dia conversava com uma amiga sobre como é difícil criar um filho que vê o pai raramente. Não porque o relacionamento não tenha dado certo ou porque algum ressentimento possa atrapalhar, mas porque por mais que a porta esteja aberta para a criança conviver com o pai, ele não entra por ela.
Vamos lá: quem nunca ouviu dizer por aí que a mãe do filho de fulano só dá problemas? Ele vê o filho quando quer, dá o dinheiro achando que está a ajudar (colega, não é nada além da tua obrigação) e ainda reclama horrores do quanto a mãe da criança só dá problemas, exige presenças do pai e aquele papo todo de obrigações que os homens têm pavor, mesmo que seja por alguns minutos.
O que muitas pessoas não entendem e não filtram antes de soltar um “ah, mas é só para te perturbar, não é?”, é que a perturbação começa quando a mulher precisa de uma folga.
Folga do tempo em que ela cuida do filho de ambos, integralmente.
Qual mãe solteira é que nunca ouviu dizerem que ela precisa de dar uma folga para o pai do seu filho? Porque ele trabalha demais, está cansado demais ou está com algo de menos. Engraçado, né? Há homens que podem ter a mesma profissão, menos ou mais tempo disponível e dedicam-se à família do mesmo jeito. Enquanto alguém lida com um pai que tem tempo para tudo, menos para os filhos, sempre vai ter plateia para aplaudir o pai que aparece quando dá e quando lhe apetece. Mas sempre será assim: se tu trabalhas fora, és a egoísta que não abre mão das próprias coisas pelo filho. Se tu não trabalhas, és a interesseira que só espera a pensão. Ou seja, estaremos quase sempre erradas, e os homens – mesmo que estejam a quilómetros dos filhos – estarão fazendo o melhor se pelo menos cumprem a obrigação financeira com o filho.
Enquanto o pai não aparece, alguém tem que fazer as compras, os lanches, os banhos, os dentes escovados, ensinar o certo e errado, ensinar a se proteger, lidar com birras, preparar e dar comida, ensinar os deveres, levar e buscar na escola, comparecer nas reuniões escolares, levar ao hospital, trocar fraldas, mudar o vocabulário (adeus palavrões)… e quem faz isso se o pai não está presente? A mãe! E isso não é levado em consideração enquanto o pai caminha livre, sem preocupações com o bem estar do filho ou em fazer-se presente, já que a mãe faz papel de dois (ou de três, porque o dia-a-dia com filhos, só quem passa diariamente sabe o quanto é trabalhoso).
E sabes o que é mais curioso? Que mesmo sobrecarregadas, sendo mulheres, mães, provedoras, cuidadoras, enfermeiras, babás, professoras e tudo mais, ainda há quem diga que somos as bruxas que não deixam os pais em paz. Com a mãe solteira, não há escala de trabalho que a impeça de ser multitarefa e de se desenrascar para conciliar a vida com os filhos. Porque de filhos, nós não temos forma de tirar licença, não é mesmo? Enquanto isso os pais que o são quando convém, curiosamente arrumam tempo para viagens, jogos de futebol, saídas com amigos, namoricos… e o filho é prioridade na vida de quem, então?
Não consigo entender como ainda é tudo obrigação da mãe, inclusive amor e carinho!
Nós, mães solteiras, temos essa mania de querer o melhor para o filho, cumprir várias funções e suprir a ausência do pai, ou tentar fazer com que o progenitor perceba que ele é sim importante na vida dos filhos. Mas isso não cabe a nós, sabias? Por mais que as nossas crianças sejam lindas, saudáveis e não entre na nossa cabeça como podem ser deixadas de lado ou vistas quando é conveniente, precisamos entender que não adianta forçar nada. Dar toques talvez funcione, mas não é uma receita de bolo que dá certo com todo o mundo.
Se tu és mãe e solteira e acreditas que não existe ex pai e apesar de toda uma história -conturbada ou não – o teu filho precisa e quer a presença do pai, demonstra isso para o progenitor. Explica como o teu filho se porta, os questionamentos e deixa claro que ele é importante na vida do filho. Mas entende que se o pai não possui interesse em colocar o filho como prioridade, não é ele que será uma prioridade na vida da criança. O que eu quero dizer: não fiques frustrada se após tu correres atrás, tentares conversar e pedires uma presença efetiva, esse pai não tenha percebido que o assunto em pauta é a importância dele no dia-a-dia do filho e na divisão justa de direitos e deveres de ambos os pais. Acontece mais do que tu imaginas. Se tu tens equilíbrio para saber separar as coisas e tentaste uma aproximação, esse afastamento não é uma escolha tua!
O nosso papel de mãe (e em muitos casos de pai, também) é criar a nossa prole da melhor forma possível. E quem faz isso por ocasião, conveniência, talvez mereça o mesmo tipo de tratamento.
Seja pai, parente ou simplesmente alguém sem o mínimo de empatia e noção da realidade.
Um dia, os nossos filhos vão crescer. E não vamos precisar falar para eles quem estava lá, quem fez tudo e priorizou a vida e felicidade deles. Porque as crianças observam tudo, principalmente sobre quem está com elas, se é ou não por obrigação.
O que podemos fazer é para as nossas crianças. Então que o foco seja nelas e o pai, que aparece raramente, faça o papel que ele mesmo escolheu: o de coadjuvante. Pode ser uma pena, mas a nossa parte diária, nós fazemos. Que os pais corram atrás dos seus filhos e parem de reclamar sobre situações inexistentes ou exageradas. Que parem com as desculpas, principalmente. E que um dia percebam que muitos pais solteiros (ou não) dão conta do recado com muito amor, carinho e diálogo. Esses sim estarão presentes nas lembranças de infância dos filhos. Se não temos pais presentes para essas memórias, os nossos filhos sempre nos colocarão nas suas nostalgias futuras.
Por: Ju Umbelino
Imagem de capa: Alena Ozerova, Shutterstock
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